O que é Arte Contemporânea?

Acredito que para saber o que uma coisa significa ou se qualifica e, não temos clareza de por onde iniciar esse processo, de algo que posso chamar de coisificação, devemos partir do princípio eliminatório, que neste caso seria o que não é arte contemporânea ou o que já foi classificado/denominado/conceituado de outra forma.

Não é vanguarda. Não é modernismo. Não é arte pop. Não é op art. Não é minimalismo. Não é expressionismo abstrato. Não é performance arte. Não é nudez. Não é vídeo arte. Não é teatro, nem dança. Não é circo. Não é Funk. Não é música. Não é não saber o que é. Não é tudo. Não é nada. Não é o vazio. Não é algo estranho. Não é Marina Abramovich, nem Cristian Duarte. Não é dançar sem música. Não é gromelô. Não é body art. Não é um produto industrial numa galeria. Não é saber dizer o que estou vendo além do que a obra me mostra. Não é design. Não é instalação. Não é tudo ao mesmo tempo agora. Não é sensorial. Não é frame, nem desframe. Não é desmatrialização. Não é arte eletrônica. Não é uma fôrma, nem uma forma. Não é grafite. Não é bricolagem. Não é nudez. Não é bichice. Não é palavra. Não é Move Berlin, Kunsten Festival Bruxelas, nem Rumos. Não é web art. Não é fotoperfomance.  Não é um aplicativo para smartphone. Não é nenhuma figura de linguagem. Não é efêmera, nem permanente. Não é sample. Não é falar, nem ficar mudo. Não é algo novo, nem artigo. Não é algo a ser inventado. Não é o hiper realismo ou o realismo de novo. Não é arte com mortos. Não é hibridismo. Não é transmidia, ou qualquer outro trans. Não é uma seita. Não é um par de coisas que ainda não escrevi aqui.

A coisa do contemporâneo vem como uma tempestade de suposições, ideias reprimidas, conceitos mau acabados, dissenso,  controvérsias. Mas a final o que poderia ser a tal arte contemporânea? Em 2011 estava em uma palestra da Professora Profª Drª Tereza Rocha intitulada “tudo o que você queria saber sobre dança contemporânea e tinha vergonha de perguntar”, no entanto a resposta veio como um não sei, para a pergunta “o que é dança contemporânea? Então como descobrir, se nem seccionando a própria arte, não encontramos uma definição clara? Será que essa secção dentro da arte produzida na atualidade? O que é o contemporâneo na verdade? Quem são os contemporâneos?

Segundo estas questões podemos subscrever o pensamento sobre o contemporâneo, do filósofo Giorgio Agamben que o descreve como:

“(…) singular relação com o próprio tempo, que adere a este e, ao mesmo tempo, dele toma distâncias: mais precisamente, essa é a relação com o tempo que a este adere através de uma dissociação e um anacronismo. Aqueles que coincidem muito plenamente com a época, que em todos os aspectos a esta aderem perfeitamente, não são contemporâneos porque, exatamente por isso, não conseguem vê-la, não podem manter fixo o olhar sobre ela” (AGAMBEN, 2009)

            Mas como identificar uma artista ou obra, contemporâneo neste sentido, ou de outra forma, como poderemos saber o que é arte contemporânea? Dentre mais diversos discursos sobre o fim da história da arte, decadência da produção artística ou ápice, podemos portanto identificar um dissenso que para Jacques Ranciere não se configura somente na valorização a diferença e do conflito sob antagonismos sociais, opiniões divergentes ou multiplicidade de culturas, para este pensador o dissenso é acima da “diferença dos sentimentos ou das maneiras de sentir que a politica deveria respeitar. É a divisão no núcleo mesmo do mundo sensível  que institui a politica e sua racionalidade própria” (RANCIERE, 1996). Neste sentido devermos entender estes paradoxos ou multiplicidade de olhares, pensamentos e identificações da arte/vida presente como o amalgama da ressonância do estar contemporâneo.

Provavelmente não haverá um surgimento de um título que enquadre todas as produções artísticas da humanidade e nem nunca houve, no entanto foi-se convencionado a partir de um pensamento dominante eurocentrista que se deveria seccionar o processo “evolutivo” e nada que não está dentro destes parâmetros é primitivo, atrasado ou de menor valor, tais como a “arte primitiva africana” (ou a “arte ainda primitiva africana”) e a tradicional (no sentido de pejorativo) arte oriental”.  Será que deveríamos propor ainda, uma arte de classes? Isto é, não necessariamente no sentido sócio-politico, mas filosófico, histórico, antropológico.

O conflitante desejo de identificar um conceito para arte contemporânea, perpassa pela imprecisa linha de criação dos artistas, que hora retomam ideias  tradicionais de pensamento como do artista Ron Mueck e a retomada de um realismo, mesmo que hiper, hora hibridizam como a videodança, hora criam novas formas de percepção e sensibilidades fruitivas através de obras sem classificação de linguagem ou com linguagens altamente subjetivas ao artista.  A menos que este conceito seja deveras generalista, ou tão precisa quanto distante de si, dificilmente haverá uma classificação direta para a produção contemporânea, ou criar-se-ão diversos movimentos, onde em alguns casos o próprio nome do artista será o suficiente.

A arte contemporânea configura-se dentro de uma produção cada vez mais vasta e de difícil conceituação, mas isso não por falta de distanciamento ou de ausência de filósofos, mas pelo fato de nem tudo ser dito com palavras.  A resposta desta questão é retóricamente infinita: o que é arte contemporânea?

(cont.)

 

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